Desde a pandemia de COVID-19, a saúde mental ganhou centralidade na agenda das empresas. Ao analisarmos os afastamentos previdenciários por transtornos mentais, é possível verificar 207.945 casos no ano de 2019 e um crescimento de 127% até 2024, atingindo 472.328 afastados. Esse aumento expressivo revela não apenas o sofrimento dos trabalhadores, mas também o impacto direto em produtividade, absenteísmo, custos assistenciais e reputação corporativa, reforçando a necessidade de ações estruturadas de prevenção, cuidado contínuo e gestão integrada desse risco.

As cinco principais doenças que motivaram esses afastamentos se mantiveram em 2023 e 2024, porém com aumentos relevantes de um ano para o outro. Além do maior número de casos, houve crescimento na gravidade dos quadros e no tempo médio de afastamento, especialmente em diagnósticos como ansiedade, depressão, transtornos de adaptação e estresse pós-traumático. Esse cenário reforçou a necessidade de atualizar as estratégias de promoção de saúde mental e ampliar políticas corporativas de prevenção, suporte ao colaborador e gestão do risco psicossocial.
Outros transtornos ansiosos (99,9%)
Episódios depressivos (89,7%)
Transtorno afetivo bipolar (88,4%)
Transtorno depressivo recorrente (78,8%)
Reações ao estresse grave e transtornos de adaptação (118,1%)

Em 2023 o estudo Covitel já demonstrava uma prevalência de 12,7% de depressão e 26,8% de ansiedade para a população brasileira, demonstrando que uma parte significativa da população se encontra adoecida.
Ao analisar a base de dados de 29 empresas que realizaram o Diagnóstico de Saúde Corporativa (DSC) da Lockton, por meio do autorrelato dos colaboradores, identificamos prevalência de 10,9% para depressão e 18,6% para ansiedade.
21% dos 34.958 participantes tinham apenas um diagnóstico de saúde mental e 8% relatavam ter ansiedade e depressão simultaneamente.
Um dado relevante que identificamos nesta pesquisa está relacionado à ideação suicida.
Segundo metanálise realizada em 2022, estima-se que a taxa de ideação suicida no mundo seja de 12,9% ao longo da vida, estudos para a população brasileira apresentam taxas que podem variar de 7,8% a 17%.
No estudo realizado com o DSC identificamos que 10,9% dos participantes responderam “sim” para a questão “Tem tido ideia de acabar com a vida” nos últimos 30 dias.
A ideação suicida é um fenômeno multifatorial e contempla variáveis sociodemográficas, socioe-conômicas, comportamentais e até nutricionais.
Segundo pesquisa conduzida na cidade de Criciú-ma com 820 indivíduos, verificou-se que aqueles com duas comorbidades tinham 3,4 vezes mais chances de ter ideação suicida, quando compara-dos a quem não tinha algum diagnóstico médico.
Também foi observado que pessoas com sintomas depressivos tinham 6 vezes mais chances de ter ideação suicida, quando comparadas com quem não apresentava estes sintomas.
Entre 2010 e 2021, a taxa de suicídio subiu 42%, sendo que a elevação mais intensa ocorreu entre 2020 e 2021, com um aumento de 11,4%. No Brasil, a ocorrência de suicídio no ano de 2021 foi de 7,4 para cada 100.000 habitantes, sendo a 3ª principal causa de morte na faixa etária de 15 a 19 anos e a 4ª para as pessoas entre 20 e 29 anos.

O adoecimento da condição mental é um problema global que acomete parte relevante da sociedade e as empresas têm um papel estratégico neste cenário.
É importante ressaltar que elas possuem uma parte dos colaboradores adoecida mentalmente devido a causas não relacionadas ao trabalho e, outra parte, por motivos relacionados ao trabalho.
Entre os fatores laborais que contribuem para o adoecimento ou intensificação dos transtornos mentais existentes, devem-se considerar os seguintes riscos psicossociais:
Excessiva carga de trabalho
Baixa autonomia ou controle sobre as atividades a serem realizadas
Pouca clareza sobre papéis e responsabilidades dos cargos
Ambiente físico inseguro para o trabalho
Tolerância a comportamentos violentos entre colaboradores, fornecedores e clientes
Discriminação, assédio moral ou sexual, insegurança do emprego ou de remuneração
Pouco apoio dos colegas de trabalho
Quando não há coordenação adequada de cuidados para transtornos mentais, isso não apenas impacta a sua qualidade de vida e produtividade, mas também pode afetar o clima organizacional, intensificar os afastamentos e aumentar o risco de ações trabalhistas e de sinistros elevados no plano de saúde.
Infelizmente, as intervenções terapêuticas convencionais, seja no consultório ou nas corporações, têm uma baixa efetividade curativa.
Nesse contexto, é essencial ampliar a compreensão sobre o adoecimento mental, reconhecendo, por exemplo, a relevância do aspecto metabólico e intestinal para o funcionamento cerebral e o impacto da mudança do estilo de vida e autocuidado para a promoção da saúde.
Para esta nova abordagem se implementar, é preciso uma mudança cultural no nível de maturidade, tanto de grande parte das empresas, quanto de muitos colaboradores, para se estabelecer uma parceria muito mais eficaz.
É chegada uma nova etapa da cultura corporativa, a Cultura da Autorresponsabilidade em Saúde, com mais clareza sobre os papéis da empresa e do colaborador sobre a gestão da saúde.
Por um lado, as corporações oferecendo os meios necessários para o trabalhador gerar valor aos seus clientes, sem gerar agravos a ele, atuando como facilitadoras de acesso ao cuidado e contribuindo com a educação em saúde.
Por outro, os colaboradores precisam tomar consciência sobre o impacto de suas escolhas para a saúde e seu papel ativo para a construção de uma vida mais saudável.

