O Impacto da Guerra na Ucrânia no Seguro Aeronáutico

Muito tem se cobrado quanto a um posicionamento do mercado de seguros aeronáuticos no que diz respeito à invasão da Ucrânia pela Rússia. É natural esta cobrança diante do cenário de guerra e as incertezas trazidas com todos os desdobramentos catastróficos.

O mercado internacional de Seguros Aeronáuticos tem experimentado respostas quase que imediatas aos grandes eventos ao longo dos anos, na atualização e elaboração de novas Cláusulas, restringindo ou mesmo ampliando coberturas diante dos eventos globais que afetam a indústria aeronáutica.

Foi assim quando da expectativa do “Bug” do Milênio; quando da criação das Cláusulas AVN2000, AVN2001 e AVN2002 e em outras diversas ocasiões, como na catástrofe do 11 de setembro 2001, quando se deu a limitação da Cláusula de cobertura de Terrorismo e outros riscos, a AVN52 e suas variações.

Não foi diferente quando da criação da Cláusula de Sanções e Embargos – AVN111 – em 1 de outubro de 2010 – que se tornou obrigatória em todas as apólices aeronáuticas emitidas globalmente.

Esta Cláusula veio em 2010, quando os EUA incluíram sanções secundárias que se adequassem ao “Patriot Act”; foram incluídos os setores de tecnologia para fins bélicos e eletrônicos.

A Cláusula de Sanções e Embargos não sofreu alterações desde sua criação, pois é bastante ampla em sua aplicação quando indica que não será permitida a violação de qualquer lei ou regulamento, ou seja, fornecer a cobertura ao Segurado seria ilegal porque violaria embargo ou sanção.

Quaisquer alterações à Cláusula AVN111 dependerão do desenvolvimento dos conflitos na Ucrânia que possam resultar em outras providências.

Pela característica global dos Seguros Aeronáuticos, tanto pela atividade operacional internacional, quanto pela necessidade de arrendamento de equipamentos junto a entidades estrangeiras e pela necessidade de maior capacidade para integralização das apólices que exigem maiores limites de responsabilidade, muitas vezes dependentes de resseguro facultativo, as apólices são “tailor made” e baseadas em Clausulados ingleses. Para a cobertura de Guerra, por exemplo, aplica-se o Clausulado inglês LSW555D.

É importante ressaltar que a AVN555D contém um parágrafo “Automatic Termination”, que indica que o seguro terminará automaticamente “Após a eclosão da guerra (se houver uma declaração de guerra ou não) entre qualquer um dos seguintes Estados, a saber, o Reino Unido, os Estados Unidos da América, França, Federação Russa, República Popular da China.” Adicionalmente, de uma forma geral, a inclusão de Cláusula LSW617D nas apólices aeronáuticas basicamente exclui operação em países sancionados pelas Nações Unidas e outros países com conflitos.

Portanto, além das restrições da AVN111 e da AVN555D para fazer face à situação de Guerra atual, há a exclusão de áreas geográficas pela LSW617H.

Todavia, a resposta esperada do mercado não será tão rápida desta vez. Esta análise sob a perspectiva do operador Brasileiro de aeronaves que com a restrição de voos para as áreas de conflito e com as Cláusulas restritivas, parecem simplificar a situação, mas esta é uma visão imediata da situação.

Há de se observar o impacto que o mercado de seguros mundial sofrerá e que, segundo matéria de 8 de março de 2022 da Insurance Insider entitulada “Russian sanctions likely to spawn $10bn+ London market aviation litigation (Adam Mc- Nestrie, Aisling Finn, Catrin Shi and Ben Wylie), a expectativa é de que o “mercado de aviação de Londres está se preparando para uma luta de vários anos para resistir à imposição de bilhões de Dólares em possíveis sinistros decorrentes do impacto indireto das sanções na Rússia”.

É muito cedo para quantificar qualquer perda potencial, mas ainda conforme a Insurance Insider, fontes do mercado estimam que entre US$ 12 bilhões e US$ 15 bilhões em limites expostos em aeronaves arrendadas retidas na Rússia (estima- se que 500 aeronaves tenham sido arrendadas para linhas aéreas russas e mais de 400 aeronaves devam estar naquele país).

A “Insurance Insider” menciona que os principais mercados de Aviation War já deram início às análises legais com a aproximação de empresas de advocacia, para aconselhamento jurídico, particularmente em torno da questão de como o impacto das sanções deve ser interpretado. Indicam que se “as perdas se cristalizarem, provavelmente atingirão um nicho do mercado de aviação chamado mercado contingente, que fornece proteção contra todos os riscos (casco) e guerra às empresas de leasing de aeronaves por meio de apólices separadas.

Não obstante, em circunstâncias em que um Lessor não consiga fazer valer seus direitos contratuais de cancelar quaisquer arrendamentos ou reaver sua aeronave, qualquer reclamação subsequente, a menos que haja danos físicos à aeronave, provavelmente recairá em riscos políticos (em lugar dos mercados de Riscos de Casco Guerra).

Muito por acontecer e muitas incertezas no que poderá ser o maior evento de perdas de todos os tempos do mercado internacional de seguros aeronáuticos.